sábado, 21 de julho de 2007

Um leilão que não se encerrou

Nem todo mundo sabe, mas atualmente existem mais de 100 ações populares contra o leilão que, em 97, retirou das mãos do Estado o controle acionário da Companhia Vale do Rio Doce. Em outubro de 2005, o Tribunal Regional Federal de Brasília julgou que 69 dessas ações não seguiriam arquivadas em Belém (PA), onde não foram devidamente apreciadas. A decisão do TRF de Brasília, além de “ressuscitar” as ações populares, pretende apurar se houve vícios no edital de venda e se a empresa foi subavaliada na época. Nesse momento, cabe recurso aos réus nas ações, que, entre 15 nomes citados, são o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, a União e o BNDES, entre outros. O jurista Eloá Cruz é autor de ação popular pedindo a declaração de nulidade do leilão. De acordo com a Constituição, a ação popular é um instrumento para que qualquer cidadão possa mover um processo sem o risco de pagar os honorários se o julgamento for desfavorável. “Basta apenas ter título de eleitor para usar este instrumento, à disposição de qualquer um”, diz. O jurista exemplifica que o leilão da CVRD não foi lícito com os seguintes argumentos: a Lei de Licitação determina que, para o leilão de bens móveis, na bolsa de valores, é obrigatória uma avaliação prévia desses bens. Do ponto de vista de Cruz, se o TRF de Brasília considerar procedente que houve a irregularidade na avaliação prévia da companhia, então isto implica dizer que a própria venda foi inválida. Cruz acrescenta, lembrando novamente a Lei de Licitação, que “Não pode haver nenhum vínculo entre avaliador e comprador”, apontando a participação do Bradesco no consórcio de avaliação de venda, para mais tarde tornar-se acionista da companhia. A consultora estadunidense Merril Lynch também é alvo de dúvidas, pois tinha relação de negócios, na época, com o Anglo American, grupo que participou da venda da Vale. Entre outros pontos, o jurista ainda defende que, como não há previsão de tempo para uma decisão favorável à anulação do Leilão, os dividendos da Vale devem ser depositados em um fundo à disposição do Tesouro Nacional, como medida cautelar. Não só isso: de acordo com a Lei de Ação Popular, se o que está em jogo é o interesse público, o presidente Lula, como dirigente da União, pode escolher de que lado posicionar-se no caso.Intertítulo. Possibilidade concretaNa opinião da deputada federal Dra Clair da Flora Martins (PT-Paraná), autora de ação questionando as ilicitudes do leilão, agora a estratégia é para que a decisão de Brasília seja mantida, visando a anulação da venda e a conseqüente indenização aos cofres públicos. A deputada informa que existe um fundo criado por lei que a companhia deveria de depositar para os estados, mas deixou de cumprir depois de privatizada. Além da disputa nos tribunais, é importante a mobilização da comunidade, cobrando dos candidatos uma posição, junto com a circulação de informação nos comitês formados nos estados. Já a ação encabeçada pela deputada estadual Socorro Gomes (PCdoB - Pará), contesta os argumentos do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso quando justificou o leilão da CVRD. Paulo Guimarães, advogado do partido, ressalta a possibilidade de que a União volte a ter o controle acionário da Companhia Vale do Rio Doce. “Se o controle acionário passasse para a União, não vai haver impacto negativo para a companhia. Haveria um acerto de contas com os investidores privados, para saber o que os participantes investiram”, pensa.

sexta-feira, 20 de julho de 2007

Movimentos Sociais denunciam maldades do PAN

No dia da abertura do Pan-Americano, Rio de Janeiro é palco de ato público

-->Vanessa Ramos,- do Rio de Janeiro (RJ)

Em frente à sede da Prefeitura, na avenida Presidente Vargas, servidores públicos, movimentos sociais, partidos políticos e delegações de outros estados reuniram-se, no dia 13, para realizar um manifesto social. O objetivo era criticar a violência, a miséria, a desigualdade social e os gastos públicos destinados às obras do Pan-Americano que, de acordo com Cyro Garcia, presidente estadual do PSTU/RJ, foram superfaturados.
Estiveram presentes no ato políticos, funcionários do Ibama, do Incra, representantes da OAB/RJ e líderes de diversos movimentos sociais, como o MST, o Fórum Estadual de Luta pela Reforma Urbana (Felru), a Rede contra a Violência, a Frente contra Remoção e pela Moradia Digna e a CUT/RJ. Entre as declarações feitas por eles, a mais repetida foi sobre o possível superfaturamento do dinheiro designado às obras do Pan. Sem nenhuma licitação, foi gasto um valor muito mais alto, R$ 3,75 bilhões, do que o planejado, R$ 800 milhões.
Para Chico Alencar, deputado federal do PSOL, esse protesto representa a consciência carioca sobre a corrupção no Pan. "Há dois anos, os gastos previstos com as obras eram dez vezes mais baixos que o valor usado hoje. O que não deixa dúvidas que é um evento altamente lucrativo para o governo e empresários que visam a especulação mobiliária", conta. Jefferson Moura, presidente estadual do PSOL/RJ, completa: "nós vamos abrir uma CPI para apurar todos os gastos com a obra".
Violência
Durante a manifestação, a ação da Polícia Militar no Morro do Alemão, realizada em junho, foi alvo de crítica. Além disso, panfletos acusando o prefeito César Maia (DEM) de estar “limpando” o Rio de Janeiro para receber turistas no período do evento foram distribuídos para os presentes. Segundo o conteúdo dos informativos, César Maia persegue mendigos, moradores, crianças de rua, catadores de papel, de latinha e prostitutas, para deixar a cidade "limpa". "A maioria dos mortos são negros e pobres", conta Cyro Garcia.
Até Cauê, mascote do Pan 2007, estava representado em impressos com uma arma de fogo nas mãos ao lado do caveirão, carro blindado utilizado pela Polícia Militar do Rio de Janeiro nas comunidades pobres da cidade. Apesar de tudo, Jefferson Moura esclarece que esse não é um ato contra o Pan. "Nós queremos que o Pan-Americano seja festejado com alegria. O esporte é muito importante para a sociedade", diz. A manifestação representa um protesto contra os interesses econômicos dos investimentos no Rio de Janeiro que "estão longe de ser uma alavanca para o desenvolvimento urbano", afirma Moura.
De acordo com o Léo Haua, da direção nacional do MST/RJ, os recursos gastos pelo governo brasileiro são muito maiores que os valores usados pelos países que também já sediaram o Pan. “[Além disso,] O evento esportivo não deixa nenhum desenvolvimento para a sociedade. Lula e César Maia fizeram uma política de violência na cidade", critica.
Futuro
E, Cyro Garcia prevê impactos socioeconômicos negativos para um evento dessa dimensão no estado. De acordo com ele, o resultado do Pan pode contribuir para o aumento da segregação social no Rio de Janeiro já que a maior parte dos investimentos ficou restrito a Zona Sul. "A aplicação de recursos na urbanização da cidade não vai melhorar em nada a situação da população. Pelo contrário, vai deixar um número de pessoas despejadas muito grande", afirma, referindo-se a ações do governo contra famílias do Engenho de Dentro, local onde foi construído o Estádio Olímpico João Havelange, o Engenhão.
Contudo, Chico Alencar, do PSOL, espera que os equipamentos esportivos, comprados para Pan-Americano, possam ser utilizados pela população pobre após o evento. "Quando construíram o Sambódromo, havia uma preocupação em manter o espaço utilizado pelos cidadãos após o término do Carnaval. Espero que a mesma preocupação mantenha os equipamentos esportivos em uso contínuo nos próximos anos", desabafa Alencar.
Apesar de a manifestação ter permanecido por quatro horas em frente à sede da Prefeitura, não houve conflito com a polícia. A concentração do ato público iniciou às 10 horas. Às 14 horas, os manifestantes se organizaram para dar início à passeata com destino a Candelária, também no centro do Rio de Janeiro.